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    Vacinas da Covid-19 não têm relação com HIV e Aids; entenda

    Notícia falsa, reproduzida pelo presidente Bolsonaro, associa, erroneamente, a imunização ao desenvolvimento da Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (Aids)

    Não existem evidências científicas da associação entre as vacinas contra a Covid-19 e a Aids
    Não existem evidências científicas da associação entre as vacinas contra a Covid-19 e a Aids Sandro Araújo/Agência Saúde DF

    Lucas Rochada CNN

    em São Paulo

    A resistência em se tomar vacinas é um problema de saúde global que prejudica o enfrentamento de doenças e aumenta o número de mortes preveníveis.

    Segundo epidemiologistas, fatores diversos explicam a recusa por parte da população em receber os imunizantes. O medo, a falta de informação, a desinformação (fake news) e o próprio movimento antivacina contribuem para afastar as pessoas das campanhas de imunização.

    Uma notícia falsa recente, que tem circulado na internet, associa a imunização contra a Covid-19 ao desenvolvimento da Síndrome da Imunodeficiência Adquirida, nome técnico da Aids.

    Em sua live semanal, realizada no dia 21 de outubro, o presidente Jair Bolsonaro reproduziu trechos da notícia falsa. No entanto, o presidente não utilizou o termo Aids durante a live.

    “Relatórios oficiais do governo do Reino Unido sugerem que os totalmente vacinados – quem são os totalmente vacinados? Aqueles que depois da segunda dose, né, 15 dias depois, 15 dias após a segunda dose, totalmente vacinados – estão desenvolvendo a síndrome de imunodeficiência adquirida muito mais rápido do que o previsto, recomendo ler a matéria”, diz Bolsonaro.

    Por conta da afirmação falsa, Facebook e Instagram tiraram o vídeo da live do ar.

    Especialistas consultados pela CNN reforçam que a afirmação é falsa e que não existem evidências científicas na relação entre vacinas e a Aids. Procurado, o Ministério da Saúde não respondeu até o fechamento da reportagem.

    CNN entrou em contato com a Secom e aguarda um posicionamento. Em uma entrevista à rádio Caçula FM, de Três Lagoas (MS), nesta segunda-feira (25), Bolsonaro comentou sobre a declaração na transmissão ao vivo de quinta-feira.

    “Na segunda-feira (18), a revista Exame fez uma matéria sobre vacina e Aids. Eu repeti essa matéria na minha live e a Exame falou de Fake News. Foi a própria Exame que falou da relação de HIV com vacina. Eu apenas falei sobre a matéria da revista Exame. E dois dias depois a Exame me acusa de ter feito Fake News sobre HIV e vacina. A gente vive com isso o tempo todo… certos órgão de imprensa são fábricas de Fake News”, disse o presidente.

    “Quando eu erro, já errei no ano passado, eu me desculpo. Vocês também erram também, às vezes dão um número equivocado e no dia seguinte vocês retificam (…) Agora, comigo não. Mas tudo bem. Não vou dizer que faz parte da regra do jogo porque faz parte da regra do jogo deles, do meu não. Eu não ajo desta maneira. Nós queremos sempre a verdade. Dói. É mais difícil você enfrentar a verdade”, completou.

    A revista Exame informou que não irá se posicionar sobre a declaração do presidente Jair Bolsonaro.

    O que diz a ciência sobre a Aids

    A Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (Aids) é uma doença causada pela infecção pelo HIV (vírus da imunodeficiência humana). O vírus ataca o sistema imunológico, responsável pela defesa do organismo. No entanto, nem todas as pessoas infectadas com o HIV desenvolvem a Aids. O tratamento antirretroviral reduz a carga viral no organismo, impedindo o desenvolvimento da doença.

    As vacinas estimulam o sistema imune a produzir anticorpos específicos contra as doenças, além de induzir a ativação de outras células de defesa do organismo, os linfócitos T.

    “As vacinas não provocam imunodeficiência. O que elas fazem é colocar o seu sistema imune em confronto com um agente estranho, montando a resposta do organismo à presença dele”, explica a pesquisadora Tânia Vergara, da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI).

    Em relação ao HIV, a pesquisadora Sylvia Lopes Maia Teixeira, do Laboratório de AIDS e Imunologia Molecular do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), explica que não há uma associação entre o vírus e as vacinas.

    “Não há nenhum fundamento científico em se falar que a vacina da Covid-19 ou qualquer outra vá desenvolver HIV. A vacina não tem nada na sua composição que possa explicar o fato de ela transmitir HIV”, afirma Sylvia.

    Em nota enviada à CNN, o Conselho Federal de Medicina (CFM) afirmou que apoia a realização de ampla campanha de vacinação contra a Covid-19, que tem se mostrado eficaz para conter o avanço da epidemia e o agravamento do quadro clínico de infectados.

    “O CFM desconhece a existência de estudos científicos válidos que associem a imunização ao surgimento da síndrome de imunodeficiência humana adquirida. Neste sentido, para proteger sua saúde, a população deve levar em consideração as recomendações das autoridade/s sanitárias sobre o tema”, diz o texto.

    No dia 23 de outubro, a Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI) divulgou uma nota de esclarecimento sobre o assunto afirmando que não se conhece nenhuma relação entre qualquer vacina contra a Covid-19 e o desenvolvimento de síndrome da imunodeficiência adquirida.

    O texto recomenda, ainda, que pessoas que vivem com HIV/Aids se vacinem contra a Covid-19, incluindo a dose de reforço (terceira dose) para todos que receberam a segunda dose há mais de 28 dias.

    Segundo a pesquisadora da Fiocruz, as pessoas vivendo com HIV em tratamento podem apresentar níveis de imunidade normais, semelhantes aos de pessoas que não vivem com o vírus. No caso de indivíduos que apresentam grau mais elevado de imunossupressão, a vacinação é ainda mais importante.

    “Em pessoas que estão em uma fase da infecção em que a carga viral, que é a quantidade de vírus circulando no organismo, pode estar mais elevada, isso pode trazer alguma imunossupressão. Elas podem estar com o sistema imunológico um pouco mais enfraquecido, por isso a importância de essas pessoas se vacinarem”, ressalta Sylvia.

    Prejuízos para a adesão às vacinas

    Na avaliação do infectologista Álvaro Furtado, do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo (USP), a desinformação prejudica a adesão às vacinas.

    “É uma fake news que ganha força na voz de uma interlocução importante no nosso país, que é a gestão central, para desacreditar e colocar medo nas pessoas com relação a uma estratégia tão importante para o retorno das atividades, da economia e da vida social que são as tecnologias de vacinas contra a Covid-19”, diz Álvaro.

    Para o especialista, relacionar Aids à vacinação também reforça o estigma sobre a doença. “É uma afirmação equivocada, sem nenhum embasamento científico, que aumenta o estigma e o preconceito contra as pessoas vivendo com o HIV, tudo que nós não gostaríamos que acontecesse em 2021”, afirma. “Com uma desinformação dessas, além de estimular as pessoas a não querer tomar a vacina, também aumenta o preconceito contra as pessoas vivendo com HIV”, completa.

    Como acontece a transmissão do HIV

    A transmissão do HIV acontece a partir do contato com sangue, sêmen, secreções vaginais e leite materno. Fluidos corporais como suor, lágrimas, saliva ou secreções como o espirro não transmitem o vírus.

    “As principais formas de transmissão do HIV atualmente são pelos processos que envolvem o sangue, quando a pessoa compartilha material que fura ou corta e não está esterilizado. A relação sexual sem uso de preservativo, por via vaginal, anal ou oral, especialmente quando há feridas na boca. Além da transmissão vertical, de mãe para filho, durante a gravidez, no momento do parto ou através da amamentação”, explica Sylvia.